Um projeto de lei que tramita na Câmara de Vereadores de Ponta Grossa, nos Campos Gerais do Paraná, pode proibir a entrega e doação de marmitas em ruas, praças e demais espaços públicos de Ponta Grossa.
A proposta foi apresentada no início do mês pelo vereador Julio Kuller (MDB), líder da prefeitura no Legislativo, e ainda não tem previsão de análise em plenário.
Em vídeo postado nas redes sociais, o vereador cita que o projeto é voltado a pessoas em situação de rua.
Kuller disse que o objetivo da proposta é o município ser responsável por manter locais adequados para que estas pessoas possam fazer as refeições com dignidade.
Na justificativa do projeto, ele também cita que ao disponibilizar espaços com condições de higiene, pode-se evitar que alimentos sejam dispensados de forma errada nas ruas, “evitando proliferação de animais em busca dos restos de comida”.
Também foi conversado com a prefeitura e com representante de um grupo de voluntários que faz doações de marmitas a pessoas em situação de rua na cidade.
A prefeitura disse que só vai se manifestar sobre o assunto após o trâmite na Câmara Municipal. Depois de ser contatada, a administração municipal abriu um cadastro para voluntários que fazem doações em Ponta Grossa.
André Caxambu, representante do grupo de voluntários GirasSol PG, considera a proposta demagógica e utópica.
Consultado pela Câmara de Vereadores de Ponta Grossa, o Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM) considerou o projeto de lei inviável juridicamente.
Veja todos os posicionamentos ao longo da reportagem.
O projeto de lei 250/2023 apresentado pelo vereador tem três artigos:
- o primeiro proíbe as doações “acondicionadas em marmitas ou recipientes descartáveis”;
- o segundo determina que a Fundação Municipal de Assistência Social (FASPG), vinculada à prefeitura, será responsável por manter locais que funcionem como refeitórios públicos e divulgá-los;
- o terceiro estabelece que as medidas começam a valer assim que publicadas em Diário Oficial.
De acordo com informações do site da Câmara de Ponta Grossa, o projeto de lei foi apresentado no dia 4 de agosto.
No dia 7 de agosto foi enviado à Comissão de Legislação, Justiça e Redação. O prazo para análise da matéria no colegiado termina nesta terça-feira (29). Até a última atualização desta reportagem, não havia manifestação disponível no site da Câmara Municipal.
Neste meio tempo, em 23 de agosto, o projeto de lei consta como enviado e devolvido pelo Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM).
O que diz o autor da proposta
Julio Kuller afirma que a ideia central do projeto é Ponta Grossa passar a ter locais específicos onde a população que recebe doações de marmitas possa se alimentar.
“Ele [o projeto] não muda nada com relação ao trabalho benevolente que as igrejas e associações fazem, mas, sim, dá um local digno para que eles possam se sentar, jantar com tranquilidade, higienizar as mãos, ir ao banheiro e assim por diante”, afirma.
O vereador frisa que a intenção é organizar as doações e justifica que a proibição nas ruas visa garantir o uso efetivo dos locais estabelecidos pela Fundação de Assistência Social.
Entre os espaço já existentes que poderiam ser utilizados, Kuller cita o Restaurante Popular e a Casa de Acolhimento Municipal, que atualmente funciona como um albergue.
A prefeitura disse que por enquanto não vai se manifestar sobre o projeto. Porém, um dia depois de ser contatada, a administração municipal abriu um cadastro para voluntários que fazem doações em Ponta Grossa.
Ao divulgar a iniciativa, a prefeitura disse ter a intenção de concentrar a entrega das doações na Casa de Acolhimento, também citada pelo líder do governo na Câmara e autor do projeto de lei.
“A ideia é proporcionar mais comodidade tanto para quem doa como para quem recebe, que poderá se alimentar em um local adequado, equipado com mesas, cadeiras e talheres, condições mínimas para garantir cidadania e dignidade ao ser humano”, diz trecho da fala da presidente da FASPG, Tatyana Denise Belo.
O que dizem os voluntários
O grupo de voluntários GirasSol PG distribui marmitas a pessoas em situação de rua e em comunidades duas vezes por semana. As ações têm dias fixos: quarta-feira, para o primeiro público, e sábado, para o segundo.
André Caxambu, representante do grupo, considera o projeto de lei demagógico e utópico.
“O projeto é genérico, fala que fica proibida a distribuição e que a FASPG que vai resolver onde as pessoas vão doar e vai achar lugar coberto. Isso é utópico, nada mais é do que um abrigo. Tem uma porção de moradores de rua que não vai para abrigos porque quer continuar na rua, onde tem seus cachorros e sua vida. Simplesmente não querem”, avalia.
Para Caxambu, a proposta dificultaria as doações, ao invés de organizá-las.
“É um projeto genérico, sem sugestão de resolução de um problema. É pura demagogia”, complementa.
IBAM aponta inviabilidade jurídica
O Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM) é uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, criada como uma esfera autônoma de governo.
Em parecer, o instituto aponta ilegalidade jurídica no projeto de lei. O documento destaca que cabe apenas à prefeitura criar atribuições a agentes e órgãos do Executivo – como a disponibilização de um refeitório público, por exemplo.
Na justificativa, também são citados dados sobre o aumento da população de rua.
“É flagrante a urgência em minimizar a insegurança alimentar dessa população, o que muitas vezes é feito através da organização voluntária da sociedade civil através da entrega de marmitas”, afirma o IBAM.
Fonte: G1 Paraná