Curitiba, PR — Um vídeo que viralizou no último final de semana, mostrando alunos do Colégio Estadual Cívico-Militar João Turin, em Curitiba, marchando e cantando versos que fazem apologia explícita à violência, chocou a opinião pública e provocou uma investigação imediata da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (Seed-PR).
As imagens mostram dezenas de adolescentes em uma quadra esportiva da instituição, sendo monitorados por um funcionário da escola, que a APP-Sindicato identificou como um militar aposentado. A data da gravação não foi divulgada e também está sob apuração.
Canto Violento e Versão do Secretário de Educação
A canção entoada pelos alunos faz referência ao Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) da Polícia Militar, com versos de conteúdo extremamente violento e agressivo, como:
“Homem de preto, o que é que você faz? Eu faço coisas que assustam o satanás. Homem de preto, qual é sua missão? Entrar na favela e deixar corpo no chão! O Bope tem guerreiros que matam fogueteiros. Com a faca entre os dentes, esfola eles inteiros. Mata, esfola, usando sempre o seu fuzil!”
Nesta segunda-feira (1º de dezembro), o secretário estadual de Educação do Paraná, Roni Miranda, se pronunciou sobre o caso, oferecendo uma versão dos fatos que minimiza a responsabilidade dos funcionários da escola e levanta a possibilidade de adulteração do vídeo.
Em entrevista à RPC, Miranda afirmou que o episódio ocorreu em outubro de 2023 e que a “atividade escolar” foi sugerida por uma aluna que seria fã de um filme. Segundo o secretário, a intervenção foi rápida:
“Foi um pedido de uma estudante que era fã de um filme. Ela começou a entoar essa canção e logo foi interrompida. Assim que esse monitor militar viu o tipo de canção, ele pediu para interromper e parar de cantar essa canção.” — Roni Miranda, secretário da Educação
Questionamentos sobre a Interrupção
A versão do secretário, no entanto, é questionada pela análise do próprio vídeo que circula na internet. O material não mostra o monitor militar interrompendo a canção. Pelo contrário, a gravação inicia com o militar chamando os alunos de “ordinários” e perguntando: “Quem é que puxa uma canção?”. Uma estudante inicia o canto, sendo seguida pelos demais alunos em uma marcha que dura pelo menos um minuto, enquanto o militar caminha ao lado, incentiva e orienta os estudantes, sem demonstrar reação negativa.
Roni Miranda disse que se reuniu novamente com o diretor e o monitor nesta segunda-feira e sugeriu que pode ter havido “montagem” no vídeo. “Até aqui, está batendo muito com a informação que eles trouxeram no dia de hoje, que ocorreu lá em 2023,” afirmou o secretário. “Nesse caso, desse vídeo que está repercutindo na internet, a gente está averiguando se esse vídeo realmente é verdadeiro ou teve tipo de montagem, porque o vídeo que nós temos aqui é de um outro ângulo.”
Repercussão e Denúncias de Doutrinação
O caso gerou forte reação de entidades ligadas à educação. A APP-Sindicato, que representa os funcionários de escolas estaduais, classificou as imagens como “chocantes” e as utilizou para reforçar as críticas ao modelo de educação cívico-militar.
A presidente da entidade, Walkiria Mazeto, afirmou que o vídeo “confirma as denúncias de doutrinação e violação dos direitos dos adolescentes pelo programa Colégios Cívico-Militares.”
“É chocante ver que a escola pública esteja sendo usada para promover uma doutrinação ideológica extremista, que prega o ódio, a violência, o massacre e o extermínio de comunidades periféricas,” declarou Mazeto, reforçando a luta do sindicato “contra a militarização da educação e a urgência do Poder Judiciário determinar o fim desse programa ilegal e inconstitucional.”
Posição da Seed-PR e Ações no Judiciário
A Secretaria de Estado da Educação do Paraná, por sua vez, defendeu o modelo educacional, destacando os resultados positivos das 312 unidades cívico-militares do estado – que atendem mais de 190 mil alunos. O número deve crescer para 345 instituições nos próximos meses.
A Seed-PR informou ter convocado os diretores da escola para prestar esclarecimentos sobre a rotina e afirmou que as manifestações vistas no vídeo “não condizem com a grade curricular e exigirá explicações”.
“Manifestações nessa linha não condizem com o compromisso do Paraná baseado em educação cidadã e transformadora,” disse o órgão, enquanto destacava o sucesso dos colégios cívico-militares em projetos educacionais como o Ganhando o Mundo e o Maratona Tech.
Ações Políticas e Jurídicas
O caso rapidamente escalou para a esfera política e judicial. A deputada estadual Ana Júlia (PT-PR) levou o ocorrido ao Ministério Público (MP) e à Defensoria Pública do Paraná, solicitando que o MP apure e identifique os envolvidos, investigando eventual responsabilidade criminal e civil.
Paralelamente, os partidos PT, PSOL e PCdoB já ingressaram com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) buscando a derrubada da Lei 20.338/2020, que instituiu o Programa Colégios Cívico-Militares do Paraná, argumentando contra a legalidade e constitucionalidade do modelo.




